quarta-feira, 17 de novembro de 2010

BRETT CARSON & TOM TÉRIK em OS GUERREIROS DE JOBAH

Por volta do ano de 1990, a Icea Gráfica e Editora (localizada na cidade paulista de Campinas), especializada em livros técnicos para agricultores, tentou atingir um público diverso daquele a quem estava acostumada a servir: investiu no mercado de Histórias-em-Quadrinhos, e esta tentativa, a despeito de terminar pouquíssimos anos depois, acabou resultando em alguns memoráveis gibis. Tivemos quatro números de Mephisto – Terror Negro (o título bem explica o gênero da revista); uma edição especial com histórias de guerra, chamada Platoon (aproveitando o sucesso da bomba de Oliver Stone, mas felizmente a revista é muito melhor); dois números do Raio Negro de Gedeone Malagola (com histórias escritas por Gedeone e ilustradas por seu filho Géderson – que não seguiu carreira nos Quadrinhos, optou pela engenharia e hoje é executivo de multi-nacional); e quatro números de uma coleção apresentando HQs de aventura, fantasia e ficção-científica, talvez a mais querida e lembrada dos vários fãs de HQ conquistados pela Icea: Os Guerreiros de Jobah.

O melhor de tudo foi que essa ousada decisão editorial da Icea de lançar Histórias-em-Quadrinhos não se limitou a republicação de material estrangeiro, mas a dar firme apoio e incentivo aos artistas brasileiros. O diretor artístico da Icea contratado para a linha de publicações em Quadrinhos foi o experiente Dagoberto Lemos, que conseguiu reunir grandes nomes do cenário nacional das agaquês: Gedeone Malagola, Julio Shimamoto, Elmano Silva, Eloir Carlos Nickel, Ofeliano de Almeida, Emir Ribeiro, Deodato Borges Filho (hoje conhecido mundo afora como Mike Deodato), Julio Emílio Braz, Luiz Antônio Aguiar e tantos outros. Além das memoráveis HQs produzidas especialmente para as publicações da Icea, os gibis tinham “alma de fanzine”, publicando contos, artigos sobre o mundo das HQs, apresentava perfis e biografias de artistas diversos. Particularmente inesquecível para mim foi o apaixonado artigo escrito por Dagoberto Lemos no primeiro número de Os Guerreiros de Jobah, explicando como a proibição das HQs do gênero terror nos EUA possibilitou o surgimento de uma notável geração de artistas brasileiros. E também foi Lemos quem ficou com a incumbência de criar um personagem que parecia ser o “carro-chefe” da coleção: Brett Carson. Mas foram somente duas as histórias com Brett Carson publicadas na vida editorial d’ Os Guerreiros de Jobah – isso porque Lemos deixou a direção artística da Icea após o número 2 (seu nome aparece ainda no expediente do número 3, mas só figurativamente). A aventura do primeiro número é chamada “Aventura No Centro Da Terra”, uma excelente história com narrativa de ação ininterrupta no melhor estilo do gênero aventura & ficção das tiras de jornais das décadas passadas, da chamada Golden Age (Era Dourada dos Quadrinhos), em especial a influência do Buck Rogers de Calkins e Nowlan. Logo na primeira página, Carson é apresentado como um arqueólogo das Nações Unidas, sofre uma queda enquanto praticava alpinismo e vai parar num estranho mundo subterrâneo onde há vários reinos que ainda não haviam tido contato com os países da superfície. Um destes reinos tem o sugestivo nome de Aquarius, que havia abolido a prática da guerra, mas pelo visto cedo demais, ou não entenderam isso os homens-macacos que os atacavam. Para enfrentar a ameaça invasora, os aquarianos vão pedir ajuda ao homem da superfície. Carson vai resolvendo as paradas na base do muque e da destreza, conseguindo resgatar a princesa de Aquarius e enfrentando um tirano da floresta no reino de Jobah. Pena que a aventura de Brett Carson no segundo número tenha despencado tanto no roteiro. O nome do personagem é grafado com dois “t” na capa do número 2, mas somente com um (Bret) na HQ do miolo, chamada “O Enigma De Linpha”. Tendo como referência a primeira aventura, esta segunda é muito devagar, quase parando, pouquíssima ação e muita conversa desnecessária. O roteirista Alvimar Pires dos Anjos sem dúvida já fez coisa muita muito melhor (e o fez nesta mesma coleção da Icea). E pena que aquele personagem parecido com Charles Bronson apareça somente na primeira página da segunda HQ, onde o herói Carson e seus aliados aquarianos se defrontam novamente contra o tirano de Jobah (que tem o simpático nome de Ranghor).


Quem substituiu Dagoberto Lemos na direção artística da Icea não merece ter seu nome citado, mas o personagem que substituiu Brett Carson nas páginas de Os Guerreiros de Jobah, este sim merece algumas palavras: Tom Térik, criado por Gedeone Malagola, tendo o paranaense Eloir Carlos Nickel a responsabilidade de dar vida a ele em sua primeira aventura (publicada no terceiro número da coleção, aquele que saiu com formato maior do que os demais): “O Ídolo Dos Sete Olhos”. Nota-se uma preocupação dos autores em criar, ao mesmo tempo, um personagem novo mas que não fugisse muito das características de seu antecessor. Assim como este, Tom Térik é um arqueólogo, e esta sua primeira aventura é tão movimentada quanto aquela de Brett Carson que vimos no primeiro número. Disposto a ajudar uma linda sacerdotisa, Térik parte em busca de um artefato místico-religioso, e nessa empreitada irá enfrentar toda sorte de perigos: felinos grotescos, serpentes gigantescas, guerreiros bárbaros, vampiros alados, desafios que enfrentará com seu vigor físico e sua espada – contando sempre com a ajuda da linda sacerdotisa Taiara. Pena que Gedeone tenha assinado somente esta aventura de Tom Térik: a despeito do talento de Nickel no traço, a história do segundo número saiu com o roteiro meio truncado, apesar da HQ “O Magnífico De Ur” apresentar alguns momentos divertidos. Os roteiristas desta segunda e derradeira história de Tom Térik optaram por narrar conto de magia e misticismo, deixando de lado a aventura.
Gedeone ainda mostrou nesta coleção de Os Guerreiros de Jobah (no segundo número), uma HQ escrita e ilustrada por ele mesmo, e que reconhecia como uma de suas favoritas: Ginóide, uma excelente narrativa futurista, que vai surpreender aqueles que conhecem o trabalho de Gedeone somente no Raio Negro. E ainda sobre Gedeone Malagola: em conversa reservada comigo revelou toda a admiração e amizade que teve não só com Dagoberto Lemos, mas também com o diretor geral da Icea, Gervásio Cavalcanti. Mestre Malagola me disse que os gibis da Icea vendiam bem, o que levou ao fim das atividades teria sido a leviandade e o desleixo de um influente funcionário lá dentro, que não entendia nada sobre e desprezava os Quadrinhos e seus artistas – e tampouco sabia tratar bem as pessoas, de modo geral. (JS)






5 comentários:

  1. essas paginas de viagem ao centro da terra.. me lembrou uma cena de A Maquina do tempo, de George Pal..

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  2. Mas que maravilha de post, acho que foi a melhor coisa que aconteceu comigo neste ano foi ter lido isto. Tocante demais. Sem palavras. Não sei o que dizer. Vou divulgar pra todo mundo.

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  3. Val, muito bem lembrando, também adoro esse filme Máquina do Tempo (a versão antiga) que sem dúvida inspirou Dag Lemos nesta HQ. A versão recente da Máquina do Tempo, achei péssima...

    Rynaldo, fico feliz em saber que vc gostou, e obrigado pelo apoio de sempre.

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  4. Jose, eu nem quis ver a maquina do tempo, nova, mesmo sendo feita pelo neto de H,G. Wells... me recusei a ver... hehehe;.. eu revi o de George pal recentemente .,.. e como sempre fiquei encantado!! Ainda tenho q ter ele na minha videoteca!!!

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  5. Fui aluno do Mestre Dag Lemos por 16 anos e posso dizer, com toda certeza, que mais do que um professor, era um amigo.
    Tive o privilégio de ver as páginas originais da HQ "Aventura no centro da terra" com minhas próprias mãos e são fantásticas!

    Eduardo Franzoi.

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